O Alquimista da Inovação: uma receita forjada no interior, com trabalho e humanismo
Esta crónica foi escrita a bordo de um avião com destino a Copenhaga, enquanto bebia um café Delta, no dia do funeral do Comendador Rui Nabeiro.
Foi nesse momento que refleti no que teria contribuído mais para poder estar ali a beber aquele café: a composição do café ou o engenho do Homem? As duas têm o mesmo denominador comum: Manuel Rui Azinhais Nabeiro, o “Sr. Rui”.
A composição química do café transporta-nos para um universo rico em variedades, processos de torra e ingredientes, onde as variantes químicas são alinhadas com o propósito de proporcionar sabores equilibrados e procurados pelos clientes. A ciência do café há muito que tem um epicentro em Campo Maior, terra de forjada no trabalho, em que a investigação e inovação têm sido as chaves no posicionamento do maior grupo português deste sector: a Delta.
O peso de um grão de café é equivalente ao nível de responsabilidade que este grupo tem conseguido colocar no seu contexto, ecossistema ou meio, como que lhe quisermos chamar. Trabalhadores, clientes, fornecedores, consumidores, habitantes – aquilo que a teoria denomina como stakeolders – representa a arquitetura de valores com que o Sr. Rui montou uma empresa sustentável e que responde a todos os desafios dos mercados globais.
Se tivermos que estabelecer alguns ingredientes para a marca que este alquimista nos deixou poderíamos adiantar 3+1 (a que se podiam juntar muitos outros):
-De Campo Maior para o Mundo. O Sr. Rui desafiou com conhecimento empírico todas as principais teorias dos custos de contexto com a construção, manutenção e alargamento do centro de produção e decisão do grupo Delta em Campo Maior. Onde outros viram uma ameaça, ele viu sempre uma oportunidade de marcar a diferença e continuar a mudar a vida das pessoas da sua terra, de marcar a dinâmica da sua região. Se olharmos para o panorama empresarial produtivo nacional, a Delta é a principal empresa instalada junto à fronteira, naquele interior que para ele significava, já há muito tempo, a proximidade com o mercado espanhol e europeu.
-O respeito e valorização da força de trabalho. Na nova vaga da gestão, os trabalhadores sofreram uma mutação, passando a colaboradores e com isso houve uma reconfiguração cosmética das relações de trabalho. Como tão bem reconhecia recentemente José Teixeira – Presidente do Grupo DST ao Expresso: “colaborador é uma designação que se inventou para retirar valor ao trabalho”. O Sr. Rui sempre reconheceu valor ao trabalho porque ele próprio trabalhou desde cedo, numa terra, à época, pobre e sem oportunidades. O valor dado ao trabalho foi sempre uma imagem de marca que caracterizou o Grupo Delta.
-O humanismo como forma de vida. Mudar o mundo está nas nossas mãos e nos nossos comportamentos, quem o provou foi o Sr. Rui, que ao longo da sua vida alimentou sorrisos – com a compartição de inumeras próteses dentárias e tendo alimentado muitas mesas – sendo sempre um agente ativo no combate à pobreza e alimentou também o tecido associativo - todo o tipo de associativismo teve sempre na Delta uma porta aberta e um apoio possível.
-O segredo do alquimista: a inquietação, a inovação. O Sr. Rui contrariou a tendência de muitas empresas de média e grande dimensão, em que crescer, estabilizar e gozar esse sucesso é o ciclo de vida normal e apetecível. Ele, como alquimista que era, estabeleceu uma receita diferente baseada no risco, no progresso e, também, na confiança. A Delta é a empresa com maior número de patentes da região Alentejo, só este indicador é bastante revelador da aposta no conhecimento e no inconformismo com querer sempre superar aquilo que se tem. Mas o Sr. Rui conseguiu fazer isto de uma forma magistral, mantendo sempre a receita original: a ligação ao território, a valorização dos trabalhadores e um lado humano na gestão.
Terminei o meu café. Mas sei que ele vai continuar a estar cheio em muitos outros sítios, em muitas outras geografias, porque o Sr. Rui também deixou aprendizes, preparou o futuro e, arrisco-me a dizer, deixou uma receita que se vai tornar eterna.
Eu fui um daqueles que teve o privilégio de privar com este alquimista dos valores e dos sonhos.
Obrigado Sr. Rui